Não pode e não deve exigir o tratamento de
Doutor ou apresentar-se como tal aquele que não possua titulação acadêmica para
tanto. É o que diz a própria Lei de 11 de agosto de 1827, responsável pela
criação dos cursos jurídicos no Brasil, em seu nono artigo.
A história, que, como boa mentira, muda a todo
instante seus elementos, volta à moda. Agora não como resultado de ato de Dona
Maria, a Pia, mas como conseqüência do decreto de D. Pedro I.
Pois bem!
Naquela
época, a história que se contava era a seguinte: Dona Maria, a Pia, havia
"baixado um alvará" pelo qual os advogados portugueses teriam de ser
tratados como doutores nas Cortes Brasileiras. Então, por uma
"lógica" das mais obtusas, todos os bacharéis do Brasil, magicamente,
passaram a ser Doutores. Não é necessária muita inteligência para perceber os
erros desse raciocínio.
1) Desde já saibamos que Dona Maria, de Pia nada
tinha. Era Louca mesmo! E assim era chamada pelo Povo: Dona Maria, a Louca!
2)
Em seguida, tenhamos claro que o tão falado alvará jamais existiu. Existem mídias
digitais contendo a coleção completa dos atos normativos desde a Colônia (mais
de quinhentos anos de história normativa). Não se encontra nada sobre
advogados, bacharéis, dona Maria, etc. Para quem quiser a consulta hoje pode
ser feita pela Internet.
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3) Mas digamos que o tal alvará existisse e que
dona Maria não fosse tão louca assim e que o povo fosse simplesmente
maledicente. Prestem atenção no que era divulgado: os advogados portugueses
deveriam ser tratados como doutores perante as Cortes Brasileiras. Advogados e
não quaisquer bacharéis. Portugueses e não quaisquer nacionais. Nas Cortes
Brasileiras e só! Se você, portanto, fosse um advogado português em Portugal
não seria tratado assim. Se fosse um bacharel (advogado não inscrito no setor
competente), ou fosse um juiz ou membro do Ministério Público você não poderia
ser tratado assim. E não seria mesmo. Pois os membros da Magistratura e do
Ministério Público tinham e têm o tratamento de Excelência (o que muita gente
não consegue aprender de jeito nenhum). Os delegados e advogados públicos e
privados têm o tratamento de Senhoria. E bacharel, por seu turno, é bacharel; e
ponto final!
4)
Continuemos. Leiam a Constituição de 1824 e verão que não há "alvará"
como ato normativo. E ainda que houvesse, não teria sentido que alguém, com
suas capacidades mentais reduzidas (a Pia Senhora), pudessem editar ato
jurídico válido. Para piorar: ainda que existisse, com os limites postos ou
não, com o advento da República cairiam todos os modos de tratamento em
desacordo com o princípio republicano da vedação do privilégio de casta. Na
República vale o mérito. E assim ocorreu com muitos tratamentos de natureza
nobiliárquica sem qualquer valor a não ser o valor pessoal.
A coisa foi tão longe à época e insistentemente até
que a Ordem dos Advogados do Brasil se pronunciou diversas vezes sobre o tema e
encerrou o assunto.
Retorna a historieta com ares de renovação, mas com
as velhas mentiras de sempre.
Agora o ato é um "decreto". E o
"culpado" é Dom Pedro I (IV em Portugal).
Mas o enredo é idêntico. E as palavras se aplicam a
ele com perfeição.
Vamos enterrar tudo isso com um só golpe?!
A Lei de
11 de agosto de 1827, responsável pela criação dos cursos jurídicos no
Brasil, em seu nono artigo diz com todas as letras:
"Os que freqüentarem
os cinco anos de qualquer dos Cursos, com aprovação, conseguirão o grau de Bacharéis
formados. Haverá também o grau de Doutor, que será conferido àqueles que se
habilitarem com os requisitos que se especificarem nos Estatutos que devem
formar-se, e só os que o obtiverem poderão ser escolhidos para Lentes".
Traduzindo o óbvio.
A) Conclusão do curso de cinco anos: Bacharel.
B) Cumprimento dos requisitos especificados nos
Estatutos: Doutor.
C) Obtenção do título de Doutor: candidatura a
Lente (hoje Livre-Docente pré-requisito para ser Professor Titular). Entendamos
de vez: os Estatutos são das respectivas Faculdades de Direito existentes
naqueles tempos (São Paulo, Olinda e Recife). A Ordem dos Advogados do Brasil
só veio a existir com seus Estatutos (que não são acadêmicos) nos anos trinta.
Senhores.
Doutor é apenas quem faz Doutorado. E isso vale
também para médicos, dentistas, etc., etc.
A tradição faz com que nos chamemos de Doutores.
Mas isso não torna Doutor nenhum médico, dentista, veterinário e, mui
especialmente, advogados.
Os profissionais, sejam quais forem, têm de ser respeitados
pelo que fazem de bom e não arrogar para si tratamento ao qual não façam jus.
Isso vale para todos. Mas para os profissionais do Direito é mais séria a
recomendação.
Afinal, cumprir a lei e concretizar o Direito é uma função muito importante para o profissional. Respeitemos a lei e o Direito, portanto; estudem e, aí assim,
exija o tratamento que conquistar. Mas só então.
TEXTO EXTRAÍDO DA INTERNET
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